Opinião – A advocacia em tempos pandêmicos – por João Américo*

Mário Flávio - 10.08.2020 às 08:27h

Na cruzada decisiva em que nos encontramos, com o desafio médico, sanitário e de saúde pública a todos imposto indistintamente, nunca foi tão imprevisível e essencial a figura do advogado. A pandemia não gera só efeitos danosos de saúde pública.

Seus desdobramentos são sentidos nas áreas de direito do consumidor, fundamentais, democracia e em toda a existência de uma sociedade de massa que vivemos. Como previsto por Hegel, citado por José Ortega y Gasse, em seu livro Rebelião das Massas, “As massas avançam!”, mas avançam para onde?

Nossa sociedade elevou o papel central da lei como marco civilizatório e de respeito à vida, ao consumo, a natureza ao existir. Ainda existe o valor vivido e bem temperado da sociedade para a democracia, que para manter-se em pé, precisa tomar doses cavalares de abundante legislação.

A norma jurídica serve, a princípio, como meio de regular as relações humanas, mas encontra-se cada vez mais contestada, por meio de pressões que impõem novas aspirações em uma hiperdemocracia que tem em regra o dever de atender todo o espectro social em suas demandas, tais como: minorias, maiorias, direitos individuais e coletivos.

Hoje a lei, e as decisões acerca, são interpretadas, discutidas e debatidas por todos. Vivemos em uma época em que a norma jurídica não se encontra mais encastelada nas mãos dos chamados operadores do direito. A lei, o direito e os tribunais são temas recorrentes em todos os espaços sociais e não apenas nos círculos dos juristas.

As Advogadas e Advogados trabalham com essa ferramenta essencial para nossa sociedade, a lei. Em tempos pandêmicos e obscuros, de muita nebulosidade e baixa luminosidade, e em momentos de confusão e turbulência, a figura do Advogado é uma lamparina para a obscuridade e trevas, e um farol para guiar alguns ou muitos para a resolução de problemas tendo como bússola a justiça, superando as dificuldades impostas pelo nosso tempo.

A técnica jurídica, se bem manuseada, produz efeitos de paz e civilidade, onde os conflitos sociais não são mais resolvidos pelo uso da força, mas sim, pela força da lei. Cabe às Advogadas e aos Advogados, manuseando como artesões a lei e os instrumentos de justiça, o reconhecimento das ilegalidades e injustiças, para que, por meio dos fóruns democráticos e instituições, onde suas vozes possam ser ouvidas, façam cessar os abusos produzidos por quem abusa do poder, da lei, e os que são praticados pela própria lei, que pode conter iniquidades e injustiça, negando direitos ou suprimindo-os.

A garantia das prerrogativas das Advogadas e dos Advogados é a garantia de que a sociedade poderá, quando assim necessitar, ter suas demandas postas em julgamento sob o prisma da lei, através do sacerdócio da advocacia, que quando bem exercida altera os rumos da sociedade. Incômodos e percalços são da vida e na advocacia não poderia ser diferente. Napoleão Bonaparte dizia preferir cortar a língua dos advogados a permitir que eles a utilizassem contra o governo, mostrando, assim, o papel central da advocacia como manancial regulador, até hoje, nas atividades estatais.

A demarcação da advocacia como elemento social e imprescindível em qualquer regime democrático ocorre pela natureza da advocacia em contestar, levantar a voz. O advogado que perder a capacidade de se indignar perderá a essência da advocacia, e poderá ser tudo, menos um advogado(a).

O Jurista Lenio Streck apresenta o modelo comportamental pelo qual a advocacia deve se pautar, com base na lei, indicando o caminho: “Quando lhe mandarem sentar, levante; quando lhe mandarem calar, tome a palavra. Pela ordem. Se não tiver nada a dizer, diga apenas: Stoic Mujic! Indigne-se!”

Por fim, parabenizamos as Advogadas e os Advogados, sempre lembrando que sem advocacia independente e com arrojo não há justiça.