O legado econômico e social da ditadura militar: desigualdade social, fome e miséria – por Fred Santiago*

Mário Flávio - 09.11.2021 às 11:25h

Ao saírem do poder, após vinte e um anos de ditadura, os militares deixaram, para as gerações seguintes, um país destruído. O Brasil comandado pelos militares foi uma verdadeira máquina de produzir concentração de renda e desigualdade social. Senão, vejamos: Em 1963 os trabalhadores gastavam 40,97% do salário mínimo com o básico para alimentação. Em 1973, mais de 60% e no fim do ciclo ditatorial, 74,38%. No que diz respeito à relação entre o salário mínimo e o aumento da produtividade dos trabalhadores temos o seguinte dado: Em 1969 o índice de produtividade foi de 5,9, enquanto o cálculo de reajuste foi de 3,0. A relação em 1971 foi de 8,1 para 3,5 e em 1973 de 8,4 para 4,0. Cabe ressaltar, ainda, que, entre junho de 1982 e abril de 1985, os salários reais caíram 20%.

No tocante a concentração de renda, os governos militares deram péssimo exemplo. Em 1964, os 10% de brasileiros mais ricos controlavam 39,66% da renda nacional. Em 1984 esse controle aumentou para 48,15%. Nesse mesmo período (entre 1979 e 1984) a renda per capita reduziu-se em 25%.

Em relação ao endividamento externo, os números são catastróficos: Em 1968: 3,7 bilhões de dólares (7% das reservas do país). Em 1973: 12,5 bilhões de dólares (51% das reservas do país). Em 1979: 49,9 bilhões de dólares e em 1984: 91 bilhões de dólares.

A dívida interna também aumentou enormemente, passando de 5.881 milhões de cruzeiros (3,6% do PIB) em 1969 para 38.394 milhões de cruzeiros (7,9% do PIB) em 1973. No quesito inflação, o período ditatorial apresentou dados impressionantes.

O IPCA em 1981 era de 91,2%; em 1982 97,9%; em 1983 179,2%; em 1984 203,3% e, fechando com chave de ouro, em 1985 o índice chegou a impressionante marca de 217,9%. No que diz respeito ao aumento da pobreza no Brasil, o governo da ditadura produziu números trágicos: Em 1984, 61,2% da população economicamente ativa do país recebia mensalmente até dois salários mínimos.

Em 1985, 35% de todas as famílias e 41% de todos os indivíduos (cerca de 54 milhões de brasileiros) viviam em condições de pobreza. A população com renda domiciliar per capita inferior à linha da pobreza passou de 38,78% em 1979 para 48,39 em 1984. Os brasileiros extremamente pobres saltaram de 17,25 milhões em 1979 para 23,70 milhões em 1985.

O percentual de indigentes na população brasileira, que em 1981 era de 18,8%, saltou para 19,4% em 1982 e fechou 1983 na casa dos 25,0%. O quantitativo de pessoas pobres em 1981 era de 50,6 milhões; em 1982 51,9 milhões; em 1983 62,7 milhões e em 1984 esse número atingia 63,5 milhões de pessoas.

Para se ter uma ideia da situação de miserabilidade provocada pelos governos militares, basta lembrar que, em São Paulo, cidade mais rica do país, em 1984, 25,9% das crianças apresentavam quadro crônico de desnutrição. Em 1984 a ONU estabelecia que, o consumo calórico mínimo per capita fosse de 3.000 para homens e 2.200 para mulheres. No Brasil, 79,5% dos brasileiros no nordeste, 87,4% no norte e 57,9% no sul e sudeste não atingiam esse número.

Os dados são claros e não nos deixam dúvidas: a ditadura militar produziu miséria, concentrou renda e tornou o Brasil um país mais desigual e injusto.

*Fred Santiago é historiador e membro do Grupo de Pesquisa Ditadura, Resistência e Memória.

FONTES:
NETTO, José Paulo. Pequena História da Ditadura Brasileira. São Paulo : Cortez, 2014.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Estatísticas do século XX. Rio de Janeiro : IBGE, 2006.
SIMÕES, Carlos. A Lei do Arrocho – Trabalho, previdência e sindicatos no regime militar. Petrópoli : Vozes, 1986.