São alvissareiras as notícias da reabertura das negociações entre a Prefeitura e os Professores municipais após quase seis meses de um cabo de guerra sem vencedores, que só produziu tensão e desgaste. Esperamos que dessa vez o executivo municipal realmente discuta propostas capazes de solucionarem o impasse, com medidas reais e efetivas, não se concentrando apenas em aspectos redacionais da lei, mas que preservem os direitos adquiridos e promovam a valorização do professor.
Dentro desse contexto de crise, emergem naturalmente algumas lições para os diversos atores públicos envolvidos, principalmente para a Prefeitura e a Câmara.
No caso do executivo municipal, pede-se mais coerência entre o que é prometido durante a campanha e o que é praticado. Por toda a duração do guia eleitoral, a situação martelou como um dos aspectos positivos da sua gestão a sua política de valorização dos professores municipais, destacando o pagamento de salários superiores à média nacional. Com esse artifício procurava-se diferenciar a atual administração da anterior. Entretanto, logo após a eleição, algo que era tão positivo – o valor do salário dos professores, a ponto de ser usado como artilharia na campanha – converteu-se em pouco mais de três meses, em um fator de crise e de risco financeiro para a cidade. Como isso foi possível?
Faltou coerência também na forma como o PCC foi articulado, para uma gestão que elencou a participação social como meta de governo e anunciou novas práticas políticas locais. Montar um projeto nas sombras, sem discutir com a categoria, com os órgãos de classe, sem consultar as Universidades e o Conselho Municipal de Educação destoa fortemente desse espírito. Isso sem falar das declarações posteriores emitidas pelo prefeito e por diversos secretários afirmando que em hipótese nenhuma negociariam com a categoria e proferindo declarações desastrosas que só acirraram os ânimos. A democracia é uma forma de governo lenta, pois exige negociações e a criação de consensos, mas é a melhor opção que temos, sem precisar resvalar para o autoritarismo e o arbítrio.
Que existiam absurdos a serem corrigidos no PCC anterior é evidente, porém se não houve pressa da gestão para corrigi-lo em quatro anos, porque agora a urgência em aprovar as correções em tempo recorde? Transparece para nós, que essa rapidez tinha como objetivo nocautear os professores e deixá-los sem ação. Já que estava aprovado e sancionado, a única coisa que caberia aos educadores era o seu acatamento, literalmente engolir o sapo engessado. Sem consultar ninguém da era educacional, montou-se um PCC na base do copiar e colar de outras prefeituras, sem preocupar-se com os impactos dele no cotidiano dos professores. Debateram com todo mundo, menos com quem entende de educação. O problema é que a correção feita no PCC provocou a precarização das relações de trabalho, a metáfora mais eficaz seria a do remédio que, ao invés de curar o doente, o matou.
Argumentou-se que o risco financeiro era maior no Caruaruprev, pois o mesmo não possuiria lastro financeiro para arcar com os aumentos sucessivos para os aposentados. Porém alguns fatos foram omitidos, entre os quais destacamos: se os professores estão ganhando mais, proporcionalmente também eles estão contribuindo mais para o fundo, o aporte da categoria também não aumenta? Outro aspecto não contemplado, é que a viabilidade do fundo é ameaçada pela própria Prefeitura, ao inchar a máquina com comissionados e temporários. Afinal só recolhem para o fundo municipal os funcionários efetivos, os temporários recolhem para o INSS. Ora como o fundo terá lastro se a grande maioria dos funcionários municipais são de temporários? Segundo o Tribunal de Contas do Estado são 67,52% em Caruaru, principalmente na área da educação.
A outra lição é para Câmara Municipal de Caruaru, pois a mesma necessita urgentemente voltar a ser um espaço de debate dos problemas municipais e não numa filial Palácio Municipal. Os nossos vereadores no afã de demonstrarem sua vinculação e subordinação ao prefeito exageram nas demonstrações de fidelidade. E terminam se encaixando no provérbio português com esses excessos, de estarem sendo mais realistas que o Rei.
Por que os professores não podem protestar ou questionar o PCC? Só porque o prefeito disse que não recuaria, e daí a defesa cega feita pelos edis? Alegam que não há mais clima para diálogo com os professores em virtude das manifestações, mas não vi o mesmo tratamento com os mototaxistas que ocuparam maciçamente a rua em frente da Câmara para protestar. E inclusive lotaram o plenário além da capacidade das cadeiras algo que foi usado como desculpa pela Mesa Diretora da Casa para proibir o acesso dos professores à Câmara. Ao serem cobrados pelos professores por seus votos, os vereadores não estão sendo agredidos ou desrespeitados, mas sim chamados a responsabilidades por suas ações, principalmente quando a maioria admitiu que votou sem conhecer o projeto. Por que não debater? Por que refugar uma audiência pública? Para não desagradar o executivo municipal ou por incapacidade de defender os seus votos?
Numa democracia, toda forma de protesto é válida, desde que não descambe para a violência física. Um homem público tem que ser cobrado por seus atos e pelas consequências geradas por ele, se o mesmo não tem condições de lidar com criticas e com o clamor das ruas, então peça para sair. É mil vezes preferível o barulho das ruas ao silêncio das ditaduras.
E a última lição é dada pelos professores à população em geral, pois demonstrou o quanto a persistência e a organização de uma categoria pode influir na vida de uma comunidade, forçando a abertura de negociações e correções de rumo. E com seus protestos os professores estão ajudando na consolidação de uma cidade plural e democrática, e como disse Alceu Valença em sua música, essa nova Caruaru já vem chegando, nós já escutamos os seus sinais.
*Mário Benning é professor e analista político