Quando foi anunciado que a Prefeitura de Caruaru iria reabrir as negociações para rever inúmeros pontos do Plano de Cargos e Carreiras da Educação, o famigerado PCC, para nós foi uma sinalização de que o bom senso tinha finalmente se feito presente na gestão municipal e que efetivamente havia uma luz no fim do túnel. Porém com o transcorrer do processo notamos, infelizmente, que as negociações até o momento foram mais jogo de cena para a sociedade, do que ações efetivas em prol da educação buscando a solução do impasse.
A prefeitura alega que cedeu o máximo e que o endurecimento nas negociações é fruto da radicalização dos professores municipais que não entenderam e não leram o documento. Ora os que aprovaram sem ler e analisar foi os vereadores. Creio que uma categoria que tem como função ensinar a ler, a escrever e interpretar são capazes de julgar a qualidade do documento, não necessitando que os iluminados membros da gestão municipal os tentem convencer do mérito do mesmo.
Principalmente porque os professores efetivos passaram por uma seleção pública de provas e títulos, enquanto os secretários tiveram como seleção o seu grau de proximidade com o prefeito e o “empenho” durante o pleito.
A impressão que nos dá, é que a prefeitura encheu o documento de pontos polêmicos, alguns claramente ferindo os princípios do direito administrativo, para recuar nas negociações, assim demonstrando que teve a boa vontade em negociar a maioria dos pontos contestados, mas se mantendo irredutível naquilo que era o real objetivo do documento, reduzir a remuneração dos professores municipais.
Mas creio que para que possamos reabrir realmente as negociações e salvar o ano letivo seriam necessárias que a gestão municipal respondesse alguns questionamentos e que simplesmente cumprisse a legislação que regula o custeio da educação e o piso dos educadores.
Já que a prefeitura alega que o atual PCC poderia quebrar o município, será indispensável auditar as contas municipais da educação para analisarmos se as aplicações, principalmente dos recursos do FUNDEB, estão seguindo o que estipula a Lei 11494/2007:
Art. 22. Pelo menos 60% (sessenta por cento) dos recursos anuais totais dos Fundos serão destinados ao pagamento da remuneração dos profissionais do magistério da educação básica em efetivo exercício na rede pública.
Esse percentual está sendo atingido? Frise-se que esse montante não é para todos os funcionários da educação, mas apenas para os professores em efetivo exercício, por exemplo, os que estão à disposição de outros órgãos têm de ser excluídos dessa conta.
Quando a prefeitura afirma que está aplicando acima do mínimo de 25% em educação, nesse caso ela está obedecendo aos critérios do artigo 71 da Lei 9394/1996?
Outro ponto é o caso da incorporação da gratificação do magistério ao vencimento, que segundo o próprio secretário de administração autorizaria a prefeitura a congelar os salários dos professores já que a prefeitura estaria pagando acima do Piso Nacional. Mais uma vez a prefeitura e seus iluminados membros da gestão afrontam a legislação da área. Esquecendo que a Lei do Piso, Lei 11738/2008 estabelece o mínimo, e não o máximo, o teto.
Sabendo que os nossos gestores tem apenas a educação como prioridade em suas campanhas e que possivelmente em nível nacional tentariam fazer o que essa administração está fazendo, reduzir o salário dos docentes, e assim interromper a valorização do professor, a lei estabelece uma barreira a essas manobras:
§ 2o Até 31 de dezembro de 2009, admitir-se-á que o piso salarial profissional nacional compreenda vantagens pecuniárias, pagas a qualquer título, nos casos em que a aplicação do disposto neste artigo resulte em valor inferior ao de que trata o art. 2o desta Lei, sendo resguardadas as vantagens daqueles que percebam valores acima do referido nesta Lei. (grifo nosso)
Além de que o possível congelamento do salário dos professores afronta dessa vez também a própria Constituição Federal de 1988:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
X – a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices. Grifo nosso
O que fica demonstrando, que Caruaru está sendo governada ao arrepio da lei, onde se tenta realizar o ajuste fiscal da máquina pública inchada jogando-se o ônus para os professores. Afinal o que esperar de uma gestão que transforma cargos comissionados, que não passam por nenhum concurso ou avaliação de desempenho, em estagiários para assim burlar a Lei de Responsabilidade Fiscal?
Caruaru demonstra que o que ela almeja é transformar o profissional da educação no material mais barato da escola. Com essas ações o Prefeito Queiroz, embora seja membro do partido de uma dos maiores defensores da educação pública, o Senador Cristovão Buarque, PDT, e tenha utilizado seus depoimentos em sua campanha está mais próximo de Carlos Lupi do que dele.
*Mário Benning é professor no IFPE e analista político