Na última troca de ministros, a presidenta Dilma usou uma frase que ficou gravada na memória: “Nosso governo é um governo de coalisão!”. Ela quis dizer, “não queríamos estar apoiando alguns partidos que nos apoiaram, mas pela governabilidade, precisamos ceder a seus interesses”. Quis dizer, “eu sei que estou deixando a desejar, eu não posso realizar o governo social que eu quero, que eu sei qual deveria ser e que poderia fazer. Por causa dos compromissos com a mídia, com partidos de identidade até opostas à nossa, com grandes corporações.”
A aliança que Lula teve que fazer em 2002 (a campanha Lulinha paz e amor com a mídia, a direita e o capital) chegou a um ponto de estrangulamento e tornou-se uma herança maldita para Dilma, o PT, a esquerda (que teve que se calar e a que continuou gritando), para o próprio Lula. Após 11 anos, não se conseguiu sanar os principais problemas do país – saúde, educação, marginalização, exclusão, fome, violência, desigualdade -, nem se elaborou um plano concreto de reestruturação. Os dados acerca dos milhões que saíram da pobreza ou entraram na classe média mascaram o fato de o governo ter que abrir os cofres para aumentar o consumo e manter o ritmo econômico. Os dados não significam de maneira alguma melhorias sociais.
A ruptura com os partidos sem identidade de esquerda já foi estabelecida quando os índices econômicos e os protestos passaram a ameaçar eleitoralmente. (Sabe-se que o PMDB acompanha os ventos favoráveis, e sabe-se que ele sempre vai rachado nos Estados também.) Se não houver uma recuperação considerável nos índices das pesquisas, o PT contará somente com partidos de identidade – socialista – e isto se criar um projeto de governo realmente diferente do que vem executando até agora (se é que há um projeto a não ser o de manter o poder.) Haverá o eixo azul e o vermelho, com propostas bem definidas, o que seria mais saudável para a política e claro para o perfil de Estado que o eleitor vai querer. (Esse problema seria solucionado com a proibição de coligações diferentes nos Estados – a chamada verticalização).
A mídia também já se posicionou. Os protestos na TV foram direcionados para a presidenta. Vimos os grandes canais comparando as manifestações de junho com o movimento pelo impeachment de Collor, tentando incutir no espectador a ideia de que assim como na década de 90, os desse ano reivindicavam a mesma coisa. Foram notícias como “… maior manifestação em 20 anos!”, “… coisa somente comparada aos caras-pintadas.”, “… presidenta Dilma fica preocupada com o povo nas ruas!”. O caráter difuso dos protestos na manipulação de alguns dos principais meios de comunicação, se transformou em revolta contra o governo, contra o PT, contra Lula e contra Dilma. Até mesmo os principais motivos de o povo ir às ruas receberam pouca ênfase: a precariedade dos serviços públicos, e a crise de representação do poder legislativo, foco da corrupção no país e da resistência às mudanças.
Da parte do capital, das grandes corporações, empresas que sustentam a economia – com salários baixos e lucros altos -, e a política – com financiamento de campanhas, principalmente de deputados -, elas já tiveram o que queriam do governo socialista que o Brasil construiu na última década, que foi não aumentar o salário-mínimo na proporção do enriquecimento do país, criar programas assistencialistas para manter o consumo, reduzir impostos (deixar de fazer investimentos), para manter os preços dos produtos baixos sem baixar os lucros das empresas. Só se queria do Estado atrasar a crise, que de qualquer jeito viria, como está vindo.
Esses são os motivos que levam a concluir acerca da necessidade de uma candidatura da parte do governo com nomes e coligações que tenham ideologias – nomezinho fora de moda – familiares, que representem trabalhadores, sem-trabalho, sem-terra, professores, estudantes, marginalizados, pobres, excluídos, vítimas da corrupção… E se os motivos expostos não forem suficientes para convencer a política, basta olhar nos olhos das pessoas que foram às ruas nos últimos dias e que irão nos próximos, para perceber a insatisfação com o que foi proposto até agora. A ruptura é urgente!
*Armando Melo é professor