
A recente fala do presidente Lula “eu sei jogar truco, e darei um seis ao Trump” — não é apenas mais uma provocação folclórica do líder brasileiro. É um recado direto, cheio de camadas, que ilustra bem o momento atual das relações entre Brasil e Estados Unidos. O problema? Lula joga truco. Mas Trump -ou o que ele representa — joga pôquer. E são jogos completamente diferentes.
A frase veio em meio à tensão diplomática crescente, após os Estados Unidos anunciarem a possibilidade de sanções contra o Brasil. Os motivos ainda são variados e difusos: questões ambientais, desacordos comerciais, ou até o reposicionamento geopolítico do Brasil, mais próximo dos BRICS e mais distante da lógica tradicional ocidental. Independentemente da motivação, o clima é de confronto – e Lula, como sempre, prefere bater na mesa do que recuar, para agradar sua bolha.
No truco, “dar um seis” é a jogada máxima. É o tudo ou nada. Você pode não ter cartas boas, mas se tiver coragem, souber blefar; mas blefar não é problema para ele, pode ganhar. É um jogo visceral, direto, com cara de bar de interior, onde o grito vale tanto quanto a carta. É a cara de Lula: popular, combativo, e acostumado a enfrentar gigantes com frases de efeito, mas que seja regado a uma boa cachacinha com jabuticaba.
Mas Trump; e aqui não falamos só do homem, mas do estilo político que ele consolidou , joga outro tipo de jogo: o pôquer. Sendo que nesse jogo, ninguém grita. O blefe é silencioso, sutil. A estratégia está em esconder a força real da sua mão, manipular a percepção do adversário e esperar o momento certo para dar o bote. É o jogo da elite, do mercado financeiro, das mesas de decisões frias. É o estilo americano de fazer política externa: parecer que está tudo bem até não estar mais.
Quando Lula diz que vai “dar um seis”, ele mostra sua disposição de confronto. Mas Trump (e, por extensão, os EUA) não joga respondendo a bravatas – responde a interesses. E, nesse tipo de tabuleiro, quem joga o jogo errado pode acabar isolado.
Isso significa que Lula está errado em reagir? Não necessariamente. O Brasil precisa sim marcar posição. Precisa mostrar que não vai aceitar ser tratado como país submisso, punido quando não segue a cartilha de Washington. Mas a forma como se joga esse jogo é tão importante quanto a disposição para jogá-lo.
Hoje, o Brasil tenta se equilibrar entre ser parte do Ocidente e liderar uma alternativa a ele. Busca autonomia energética, protagonismo ambiental, e alianças com a Ásia e o Sul Global. Mas, para isso funcionar, precisa estratégia, precisa jogar pôquer também.
A diplomacia brasileira não pode depender só do grito do truco. Ela precisa da frieza do cálculo. Precisa entender que o jogo geopolítico é feito de camadas: a fala pública é uma, a negociação privada é outra, e os acordos silenciosos que ninguém vê muitas vezes decidem tudo. Lula sabe jogar truco. Mas, se quiser vencer o jogo maior, precisa de um bom conselheiro de pôquer ao lado, um Michel Temer por exemplo. Porque, nesse jogo, quem mostra a carta cedo demais perde a mão ou mais um dedo — e, muitas vezes, о jogo todo.
Oscar Mariano é cientista político