Nos últimos meses, uma narrativa preocupante tem ganhado força: a tentativa de associar a baixa popularidade do governo Lula e um possível fracasso da atual gestão à influência de sua esposa, Janja da Silva. Esse movimento, além de politicamente desonesto, carrega um viés machista evidente, que busca desqualificar uma mulher por simplesmente ocupar um espaço de protagonismo ao lado do presidente.
Historicamente, as primeiras-damas foram relegadas a um papel figurativo, restrito a ações sociais e eventos protocolares. Janja, no entanto, quebrou esse molde ao se posicionar politicamente, participar ativamente de debates e influenciar decisões estratégicas do governo. Essa postura desagrada setores que ainda esperam que a esposa de um presidente seja apenas uma figura decorativa.
Atribuir ao peso da primeira-dama os desafios enfrentados por um governo inteiro é ignorar deliberadamente fatores estruturais, econômicos e políticos que determinam o sucesso ou o fracasso de uma gestão. Se há desarticulação política, dificuldades econômicas ou crises institucionais, a responsabilidade recai sobre as lideranças que ocupam cargos estratégicos – ministros, parlamentares, assessores –, e não unicamente sobre a esposa do presidente.
Curiosamente, esse tipo de ataque não ocorre quando se trata de cônjuges homens. Nenhum presidente foi acusado de fracasso por influência da esposa, por mais atuante que ela fosse. Esse fenômeno revela um padrão de misoginia que tenta transformar mulheres com voz ativa em alvos fáceis de culpabilização.
O debate sobre os rumos do governo Lula deve ser feito com seriedade e responsabilidade. Criticar políticas públicas, estratégias de gestão e articulação política faz parte do jogo democrático. O que não pode ser aceito é o uso da figura de Janja como bode expiatório para encobrir problemas que vão muito além de sua influência. Se há algo que precisa ser analisado, que seja o desempenho de quem realmente tem cargos e poder institucional, e não da mulher que, mesmo sem mandato, se tornou um símbolo de independência e protagonismo feminino.
