A Justiça Federal determinou que a União, por meio do ministério da Saúde, cumpra decisão judicial que trata sobre a obrigatoriedade da prorrogação do contrato para aquisição do Fator VIII Recombinante junto à Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia (Hemobrás), com sede em Goiana, na Mata Norte, até o término da Parceria para o Desenvolvimento Produtivo (PDP) com a estatal.
A medida atendeu a um pedido do Ministério Público Federal (MPF). O prazo para início do cumprimento da decisão é de 15 dias a partir da notificação da União, que ocorreu no dia 7. O Fator VIII Recombinante é usado no tratamento de pacientes com hemofilia.
Em caso de não cumprimento da determinação, o MPF requereu que seja aplicada multa diária no valor de R$ 100 mil, conforme decisão proferida na 1ª instância da Justiça Federal em 2018. No requerimento, o MPF reforçou que “o contrato de fornecimento do Fator VIII Recombinante firmado entre a Hemobrás e a Takeda (antiga Shire) estabelece que os pedidos anuais de compra sejam encaminhados até o dia 31 de outubro do ano anterior, para que seja viabilizada a produção dos medicamentos em tempo hábil – entretanto, o processo ainda não foi finalizado pelo Ministério da Saúde”.
A procuradora da República Silvia Regina Pontes Lopes destacou ainda que, “caso a decisão judicial não seja cumprida imediatamente, há grave risco de desabastecimento a partir de abril de 2022, prejudicando o atendimento da demanda do Sistema Único de Saúde (SUS)”.
A decisão judicial que obriga a União a prorrogar o contrato com a Hemobrás foi obtida pelo MPF na 1ª instância em 2018 e confirmada depois pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5). A União recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Embora esse recurso ainda não tenha sido apreciado, não possui efeito suspensivo. Assim, segundo o MPF, não impede o cumprimento imediato das decisões judiciais anteriores.
A procuradora da República alegou que, segundo decisão do Tribunal de Contas da União (TCU), caso o MS opte por adquirir o Fator VIII Recombinante fora do âmbito da PDP existente, terá de considerar previamente uma série de fatores, como os novos investimentos necessários e as possíveis indenizações a serem pagas pela extinção unilateral da parceria. Ao ajuizar a ação para manutenção do contrato entre União e Hemobrás, em 2017, o MPF buscou também impedir eventual transferência de tecnologia para processamento de plasma para o Paraná, conforme havia defendido publicamente o Ministério da Saúde do governo Michel Temer (MDB), apesar dos investimentos já feitos no âmbito da PDP. Na época, o ministro da Saúde era Ricardo Barros (PP), hoje deputado federal e líder do governo Jair Bolsonaro na Câmara.
O MPF apurou que o Ministério da Saúde vinha negociando com a empresa Octapharma Brasil a construção de nova fábrica de hemoderivados e recombinantes em Maringá (PR), sem realizar licitação ou apresentar justificativas científicas, técnicas e legais para a medida. A Octapharma, conforme destacado no processo, era investigada em diversos procedimentos apuratórios no Brasil e no exterior.
O ajuizamento da ação foi motivado ainda, entre outras razões, por informações de que o Ministério havia suspendido a PDP de Fator VIII Recombinante, no âmbito da parceria com a Hemobrás, tendo como parceiro responsável pela transferência de tecnologia a empresa Baxter. Na ação, o MPF argumentou que “o intento do Ministério da Saúde violou frontalmente os princípios da administração pública inscritos na Constituição da República, notadamente o da eficiência e moralidade”.
A Hemobrás atua para reduzir a dependência externa do Brasil no setor de derivados de sangue e biofármacos, ampliando o acesso da população a medicamentos essenciais à vida de milhares de pessoas com hemofilia, imunodeficiências genéticas, câncer e Aids, entre outras enfermidades.
A única forma de acesso ao tratamento necessário nesses casos é pelo SUS, por intermédio das providências adotadas pelo Ministério da Saúde, pois a Constituição Federal veda a comercialização de hemoderivados no Brasil.