Coluna do blog do MF da sexta – Entre o discurso e a invasão: o risco do radicalismo seletivo para Lula

Mário Flávio - 04.07.2025 às 07:08h

A invasão do saguão da sede do Banco Itaú, na Avenida Faria Lima, em São Paulo, nesta quinta-feira (4), por militantes ligados ao MTST, ao PT e ao PSOL, acendeu um sinal amarelo para o Palácio do Planalto. Embora o protesto tenha transcorrido de forma pacífica e sem depredação, o simbolismo do ato é explosivo: manifestantes pressionando fisicamente uma instituição privada, com faixas cobrando a taxação de super-ricos — exatamente um dia após o presidente Lula (PT) adotar o mesmo discurso em ato público em Salvador.

Não é coincidência. A movimentação coordenada revela uma tentativa clara de pressionar o Congresso Nacional a avançar com a proposta de taxação para contribuintes que recebem mais de R$ 50 mil mensais. O problema é a forma. A tática, apesar de legal e não violenta, lembra métodos frequentemente criticados pela própria esquerda quando aplicados pela extrema direita — como no caso das invasões de prédios públicos, atos com discurso de intimidação institucional e ocupações que extrapolam o espaço do diálogo democrático.

A esquerda, que sempre buscou se diferenciar da chamada “radicalização” bolsonarista, parece flertar agora com os mesmos instrumentos — ainda que com outra roupagem. Essa aparente contradição pode custar caro ao presidente Lula, especialmente num cenário em que sua popularidade está em baixa e os eleitores de centro e independentes observam com cautela os extremos do espectro político.

Lula, ao alimentar o discurso da pressão social e da mobilização nas ruas, pode estar apostando no “embate de forças” para romper a paralisia legislativa. Mas há riscos. Ao incentivar, mesmo que indiretamente, ações como a do Itaú, o presidente pode ser associado a métodos que ele próprio — e seu campo político — condenaram nos episódios mais graves do bolsonarismo. A memória dos brasileiros ainda está viva quanto aos atos de 8 de janeiro de 2023, e qualquer resquício de radicalismo, mesmo simbólico, tende a gerar rejeição.

Além disso, ao mirar os “super-ricos” com retórica de confronto, Lula alimenta uma polarização que pode provocar reações contrárias e enfraquecer a construção de maiorias no Congresso — essenciais para aprovar a agenda econômica que o próprio governo propõe. Não se trata de questionar a legitimidade da pauta tributária, mas sim os meios adotados para promovê-la.

O episódio é, portanto, um alerta. A esquerda não pode querer combater os radicalismos da extrema direita com métodos que se aproximem deles. Se o campo progressista deseja manter sua autoridade moral no debate democrático, precisa fazer da coerência uma prática constante — mesmo nos momentos de tensão. Pressão social legítima não pode significar intimidação, sob pena de esvaziar o discurso institucional que a própria esquerda sempre defendeu.

A eleição de 2026 está cada vez mais próxima. E o eleitorado, cansado dos extremos, pode não tolerar mais ambiguidades. Lula, experiente como é, sabe disso. Resta saber se a base que o cerca — e que atua nas ruas — também compreende o tamanho da responsabilidade.