Coluna da terça do blog do MF – Quando a prudência foi queimada: o risco de Moraes dobrar a aposta

Mário Flávio - 05.08.2025 às 07:16h

Por mais que o Direito se ancore em princípios como legalidade, impessoalidade e, principalmente, prudência, o que se viu nesta segunda-feira (4) foi o completo abandono dessa última virtude. Ao decretar a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro, o ministro Alexandre de Moraes escolheu dobrar a aposta — e, ao fazer isso, incendiou um cenário que já estava politicamente inflamável.

A decisão, mesmo com seus fundamentos jurídicos, tem um peso político inegável. Ela não atinge apenas o ex-presidente: lança um recado direto à oposição, ao Congresso, às ruas e até ao exterior. O momento escolhido e a contundência da medida indicam que Moraes decidiu romper com qualquer tentativa de distensionar a crise institucional em curso. O ministro não está mais apenas agindo como juiz — está respondendo como figura central de uma disputa de narrativas que ultrapassa os limites do STF.

No domingo anterior, uma multidão foi às ruas em apoio a Bolsonaro. A manifestação surpreendeu pela adesão e pelo tom direto dos discursos, muitos dos quais pedindo o impeachment de Moraes. O recado foi claro — e, para a oposição, a decisão do ministro é encarada como uma revanche, uma resposta pessoal disfarçada de ordem judicial.

No exterior, o clima também esfria. Os Estados Unidos, que já aplicaram sanções a Moraes via Lei Magnitsky, consideraram a prisão domiciliar mais uma violação de direitos humanos. Em nota, o governo americano expressou preocupação com a escalada de medidas judiciais no Brasil e não descartou novas sanções nos próximos dias.

Enquanto isso, o Congresso Nacional retoma os trabalhos sob um clima de hostilidade crescente ao Executivo e, agora, também ao Judiciário. A oposição vê na prisão de Bolsonaro uma tentativa de afastá-lo de qualquer possibilidade de articulação política — inclusive nas eleições presidenciais de 2026. O próprio texto da decisão de Moraes dá margem para entender que manifestações públicas podem ser coibidas, o que já levanta dúvidas sobre o ato marcado para 7 de setembro.

Bolsonaro, como sempre, desafiou. Moraes respondeu com força. Trump, lá fora, observa e pressiona. E o Brasil, no meio desse jogo de poder, caminha sobre uma corda bamba institucional.

É difícil acreditar que isso terminará bem. Quando o Judiciário passa a agir como ator político e se torna parte do jogo, perde sua posição de equilíbrio. Moraes não está mais tentando conter uma crise — está alimentando uma. E a prudência, essa sim, parece ter sido a primeira vítima. A conferir.